segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Em torno de Marx

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

A queda do muro de Berlin e em conseqüência a derrocada do socialismo do Leste Europeu colocou o pensamento de esquerda em crise.
Alguns, mais afoitos, declararam o fim da história. E nesses últimos anos o mundo mudou e vem mudando diuturnamente. Consolidando-se a democracia como os anseios de uma sociedade moderna. Nas estantes das livrarias escassearam os livros que tratam da ideologia.
Os pensadores de esquerda estão nos devendo um debate aprofundado sobre o socialismo democrático. Se por um lado há uma necessidade de uma discussão aprofundada dos caminhos da esquerda nas teses socialistas, nas conquistas de governo, tem sido bem sucedida, haja vista alguns governos da America Latina.
Embora a carência desse debate ideológico, Leandro Konder nos apresenta esse Em torno de Marx. Um belo exemplar que recoloca na pauta nomes como Marx, Engels, Lênin, Trotski, Gramsci, Lukács e tantos outros.
Eu diria que é uma leitura obrigatória para aqueles que – na engrenagem da máquina estatal – se desvirtuaram de algumas teses históricas e caras para a esquerda.
O livro é composto de três partes.
Em torno de Marx que trata de vários temas relacionados pelo filósofo entre eles: O homem e a obra revisitados, a moral, religião, morte, Marx na história e história em Marx e dialética.
A herança de Marx faz uma breve releitura das obras dos marxistas Theodor Adorno, Walter Benjamin, Herbert Marcuse, Jean-Paul Sartre, György Lukács e Antonio Gramsci.
E por fim O Marxismo no Brasil que recapitula os primeiros militantes e a fala da direita no Brasil, de 1936 a 1944.
Algumas abordagens são bem interessantes. Há uma citação do próprio Marx afirmando que não era marxista. Aspectos da vida pessoal do filósofo, o relacionamento com os filhos e com o pretendente a genro Paul Lafargue mostra um Marx preocupado com o futuro dos filhos no caso a filha Laura. Por vezes, numa atitude conservadora na cobrança da postura do genro diante da amada.
Nas análises dos pensadores despertou-me maior interesse na leitura ou releitura de Lukács e Gramsci, que, segundo Konder, era o mais fascinantes de todos os marxistas.
Konder cita vários livros dos autores analisados e os mais diversos temas que escreveram. O livro de György Lukács A teoria do romance está na minha lista para leitura. Encontrei uma maneira de ler um pensador de esquerda numa abordagem da temática ficção.
Em torno de Marx é uma espécie de livro de “auto-ajuda” político para aqueles que estão meio desacreditados da ideologia ou que estão assoberbados e em estado de êxtase diante do poder, esquecendo algumas cláusulas pétreas de uma verdadeira esquerda democrática.
Leandro Konder fica nos devendo um Em torno de Marx no Brasil no século XXI. Um debate interessante. Partindo do pressuposto que haja um marxista no governo Dilma, imagino que não seja fácil ser marxista e pragmático quando negociar cargos ou fazer acordos com a base aliada.
Essa discussão precisa ser feita com uma certa urgência, pois, como alguém citou no livro, não queremos concluir que o último marxista tenha sido Trotski.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Extradição

Athos Ronaldo Miralha da Cunha
twitter.com/athosronaldo

A última atitude de Lula como presidente foi uma ação extremamente política. Não assinou a extradição de Cesare Battisti.
Assim, a polêmica foi instaurada na mídia. Muitos debates e inúmeras teses. E todos os formadores de opinião deram o seu pitaco. Com o caso Battisti afloram as rusgas entaipadas entre a direita e a esquerda verde-amarela. Se esse assunto vem à tona na copa do mundo, não tenho dúvidas, o polvo Paul daria seu palpite. E seria taxado de comunista ou direitoso.
O ex-guerrilheiro italiano ainda deverá se assunto em muitas páginas de jornal. Se uma despretensiosa bolinha de papel causou um deus-nos-acuda na última eleição, imagino o alvoroço que será quando o governo italiano recorrer à corte de Haia.
No entanto, no meu entendimento, o debate deve ser político. Cesare Battisti foi guerrilheiro na Itália da década de 70. E militante da organização Proletários Armados pelo Comunismo (PAC). Hoje parece meio estranho, meio fora de moda. A expressão “proletários armados” soa como algo alheio aos anseios da nossa sociedade. Mas para analisarmos com parcimônia devemos levar em conta a conjuntura política na Itália da década de 70. Na Itália, bem como no Brasil, aquele período induzia e provocava a proliferação de grupos guerrilheiros que sonhavam com a revolução pelas armas. Todo militante de esquerda era um Che Guevara em potencial.
Uma das questões amplamente debatidas é sobre o tipo de crime cometido pelo italiano, se foram políticos ou comuns. E nessa discussão os adeptos da tese de crime comum, por consequência, favoráveis a extradição, são os mesmos que guardam a 49 chaves os arquivos da ditadura brasileira. Mas isso é outra vertente do mesmo tema.
Particularmente, não consigo raciocinar juridicamente, nem tenho aptidão para tal, portanto, na política a Cesare o que é de Cesare. Penso que Lula fez o que deveria ser feito. Na pior das hipóteses, e do tempo decorrido, devemos acatar o benefício da dúvida sobre a real ação de Battisti no grupo revolucionário e nos crimes cometidos. E, além do mais, Lula não iria extraditar um militante do PAC (sic) uma das siglas mais festejadas no Brasil nos últimos tempos.
Certamente, os adeptos das teses da extradição alegam que Battisti já foi condenado pela justiça italiana e essa tecla será batida até que, numa próxima eleição, outra bolinha de papel desvie o foco das atenções.
Enfim, nunca participei de um partido revolucionário, e nem lutei contra a ditadura – não tinha idade para isso –, mas se o STF quiser me extraditar para a França eu não coloco empecilho. Não vou alegar perseguição política. Topo sem pestanejar. Viver como um perseguido político ou criminoso comum em Paris não deve ser de todo ruim.