sábado, 23 de fevereiro de 2013

Yoani Sanchez e Bento Gonçalves




Athos Ronaldo Miralha da Cunha

No início da década de 80 do século passado um livreto publicado aqui no sul causou um alvoroço nas hostes dos ctg’s e do movimento tradicionalista.
A gauchada já estava de arma e ferro branco em punho para dar início a 2ª Revolução Farroupilha e dar cabo do maleva que ousou atacar a memória do grande líder farrapo. Patrão, capataz, sota-capataz, peões e prendas já estavam na ponta dos cascos. Cada debate entre o autor do livro e um guasca era uma guerra verbal. Um deus nos acuda.
Bento Gonçalves da Silva o herói da Revolução Farroupilha havia sido atingido em sua honra. Vilipendiado em sua trajetória por uma publicaçãozinha besta. Estavam denegrindo a imagem do cara que seria o presidente da República Rio-Grandense.
Tau Golin foi o autor do livro “Bento Goncalves herói ladrão”.
Por que a ira da gauchada?
Desde criancinha a gente aprende que Bento Gonçalves era o herói, o nosso libertador. Então, vem um fulaninho de tal e diz que a história não é bem assim. Que Bento era um ladrão de cavalos. Isso desmorona todas as nossas crenças. Tudo que a gente acredita é jogado por terra. Aí a gente esbraveja e xinga. E sai no tapa – ou no coice – se necessário.
Então chegamos à Cuba de Fidel. O sonho do socialismo brindado nos copos de Cuba Libre. Uma geração sonhou com os libertários de Sierra Maestra. Che, Fidel e seus companheiros derrubaram uma ditadura para implantar um governo dos trabalhadores. A classe trabalhadora no poder. E esse sonho tomou conta da América Latina. Che Guevara virou um mito para os trabalhadores e jovens que sonhavam com a revolução e Fidel envelheceu na Ilha. Temos notícias de Cuba sobre índices elevados de educação e saúde. Em Cuba todos têm dentes e ninguém passa fome. E isso nos enche de alegria e certeza num mundo melhor.
Mas uma moça metida a besta resolve abrir o bico.  E diz que não é bem assim, pessoal. Cuba não tem imprensa livre. Cuba tem presos e perseguidos políticos. Em Cuba os trabalhadores não podem se associar livremente em sindicatos e partidos. Há censura em Cuba e o regime afronta os direitos humanos. Não há democracia em Cuba. Mas como! Quem é essa traidora a serviço do imperialismo ianque? Quem ela pensa que é? Quem é essa fulaninha? Viramos bicho empunhamos cartazes e vamos xingar e esbravejar nossa indignação. E colocamos o debate de ideias no lixo. Não há argumento que nos remova. Ela é uma mentirosa a serviço do capitalismo internacional.
Essa ira é perfeitamente justificável. Yoani Sanchez colocou por terra nossos sonhos, nossos ideais de uma sociedade justa. Colocou uma pá de cal na utopia cubana tão debatida no “Em cena” – uma espécie de Ponto de Cinema da época – nas madrugadas adentro. Quantas cervejas tomamos debatendo o socialismo cubano com uma boina à Che Guevara na cabeça?
E o que resta para os que não admitem ver Cuba de outra forma: negar. Nega-se porque as afirmações de Yoani rompem com nossas crenças. Nega-se porque a verdade dói. A blogueira desnuda um horizonte que não enxergávamos, ou não queríamos enxergar. É muita sacanagem dessa blogueira. Sinceramente, eu preferia ficar sonhando com Cuba Livre.
José Saramago definiu bem o que pensava da Cuba de hoje. “De agora em diante Cuba segue seu caminho. Cuba perdeu minha confiança e fraudou minhas ilusões”.
A visita da cubana Yoani Sanchez fez bem ao debate ideológico para o Brasil – fazia tempo que não se debatia política e ideologia – tudo já vinha arrumadinho, tínhamos que só acatar e digitar o número na urna eletrônica. A blogueira colocou o debate nacional sobre democracia, liberdade de expressão e direitos humanos. E a conclusão é de que temos muito que aprender, principalmente os verborrágicos com viseira que ainda vivem sob a égide da guerra-fria.
Enfim, nos índices sociais – educação e saúde – Cuba está em sua excelência. Mas a Ilha precisa avançar nos aspectos políticos, principalmente no quesito democracia.
Se os meus amigos à esquerda já estavam indignados comigo, com esse texto arrumei ojeriza do Movimento Tradicionalista Gaúcho. Por que fui ressuscitar essa história do herói ladrão? “Oigaletê porquera!”
– Taberneiro! Salta uma Cuba Libre.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Tragédia da boate Kiss e as "Madres de plaza de Mayo"





Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Em 1978 as mães de desaparecidos políticos na Argentina buscavam noticias de seus filhos, como não obtinham respostas dos gestores de plantão – havia uma ditadura na Argentina – essas mães protestavam na praça de Maio em frente a Casa Rosada. Elas faziam caminhadas silenciosas com lenços brancos na cabeça que era o símbolo da luta pela justiça. As mães da praça de Maio fizeram mais de 1500 protestos, elas exigiam o paradeiro de mais de 30 mil desaparecidos e 500 crianças – filhos de presos políticos – que foram enviadas para adoção. Essas “Loucas da praça de Maio” mantem uma universidade, uma rádio e uma biblioteca.
Perseverança, indignação e uma busca incansável por justiça. Esse o legado que temos como exemplo dessas determinadas Mães Argentinas. É nesse sentido que a juventude, pais, amigos e população dessa Santa Maria da Boca do Monte exigirá com respeito ao assassinato coletivo que houve na boate Kiss no fatídico dia 27 de janeiro de 2013. Não queremos nada por debaixo dos panos, queremos lenços brancos nas cabeças em busca de justiça. Não queremos políticos de plantão em busca dos holofotes da tragédia. Queremos “locas y locos” rondando a nossa Casa Rosada clamando por justiça.
São 238 jovens mortos, mais de uma centena de feridos e é notório que essa tragédia da boate Kiss foi causada pela ineficiência e inoperância dos poderes públicos – municipal e estadual –, e até o presente momento ninguém, mas ninguém mesmo foi exonerado de seu cargo. Estão todos lá, tentando justificar o injustificável. E isso é um acinte à memória dos jovens falecidos, às famílias enlutadas e a população em geral. E quando a gente fala em omissão dos agentes públicos ficam cheios de dodóis.
Não está no horizonte dos gaúchos alguma impunidade como consequência dessa tragédia da boate Kiss. Como está bem explicitado nas reportagens, há uma cadeia de responsabilidades e esperamos que os responsáveis pelo funcionamento dessa câmera de gás – projetos, licença e fiscalização – sejam devidamente julgados.
Nesse triste episódio temos um julgamento criminal e o julgamento político. Não podemos dissociar, há agentes públicos nessa engrenagem macabra de responsabilidades. E não passa pela nossa imaginação a impunidade sobre a péssima gestão da máquina pública. Assim, os criminosos responderão pelos crimes e os gestores públicos pela sua inoperância. Só resta saber qual a pena cabível para esses gestores?
Ministério público entrou na investigação sobre as responsabilidades da noite de 27 de janeiro na boate Kiss. E eu acho que a cobra vai fumar... assim espero. Nesses tempos de impunidades a lo largo Brasil afora, não há mais espaço para a complacência e jeitinho diante das vítimas da boate Kiss. O nosso grau de indignação está muito elevado para permitir esse descaso. Aqui a lei de Roberto Jefferson não funcionará. Never complain, never explain, never apologise". Tradução livre “Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe”. Meus caros, se estão esperando por isso, tirem o cavalinho da chuva.
Se a impunidade for a consequência dessa tragédia, seremos eternos errantes a caminhar silenciosamente na praça Saldanha Marinho.

ps
Só para constar.
No caso do incêndio da boate República Cromañón em Buenos Aires que vitimou 194 pessoas em 2004, o prefeito foi apeado de seu cargo após um julgamento politico em 2005.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Os agachados - Crônicas da Era Lula




Na quarta tentativa de ser presidente do Brasil, Lula consegue seu intento. E foi uma vitória que gerou muitas expectativas, pois naquela oportunidade a esperança vencera o medo. O primeiro operário assumir a presidência e com o compromisso de mudanças e avanços nas politicas sociais. Como sabemos, os oito anos de Lula foram de alguns avanços, articulações e formação de uma base aliada afinada com o planalto. Mas, também, foi um período de escândalos envolvendo o núcleo duro do governo. Assim, haverá muitas histórias e estórias a serem debatidas, no entanto, uma visão crítica, irônica e humorística também poderá ser uma leitura prazerosa e menos densa. Uma visão leve dos desmandos e da prática politica no Brasil. Transformar o que nos indigna em textos despretensiosos que nos fazem esboçar um sorriso ou um momento de reflexão.
Então, esse “Os agachados” é um livro de crônicas no sentido literal da palavra. São crônicas elaboradas nos oitos anos do mandato do presidente Lula. Os textos a seguir, não são artigos opinativos ou ensaios, embora numa crônica nós podemos embasar  uma opinião, mas nesse caso são textos que tratam com humor, ironia e, em alguns momentos, com introspecção a política daquele período.
Nessas páginas teremos um pouco do Lula que assumiu e do Lula que deixou a presidência. Afinal, nunca antes na história desse país... Boa leitura.